Não sei negociar
Pedro Neiva de Mello
Quando me casei fiz um contrato pré-nupcial. Nele não havia divisão de bens ou valores, mas de prioridades, cláusulas vitais para a boa convivência. Minha esposa colocou alguns pontos e eu outros. Na época achei que tinha coberto todas as questões mais importantes. Hoje já acho que me saí mal nessa negociação. Minhas cláusulas fora: nunca ter um cachorro em casa, visto que ela tinha uns 200 e eu não gosto de cachorro em apartamento, e que nossos filhos seriam alvinegros, visto que ela torcia para aquele clube da Gávea.
Diferente de outras namoradas que tive antes dela, minha mulher era flamenguista mesmo de ir ao Maracanã, debater futebol com o porteiro e, até, viajar com time para outros estados para vê-lo jogar. To falando de uma urubu de pedigree, se é que isso existe. Assim, entendi que seria vital para nossa boa convivência que nossos filhos fossem Fogão. Ela topou de cara. O amor e a proximidade do casamento são mesmo mágicos.
Hoje tenho 2 filhos. Ambos alvinegros, como previa o acordo pré-nupcial. De quebra minha mulher, vendo a pegada dos filhos pelo alvinegro, também se converteu em 2009.
“O futebol é a coisa mais importante dentre as menos importantes”. Eu deveria ter me lembrado desta máxima antes de assinar aquele contrato.
Hoje olho pra minha casa preta e branca e me pergunto se fui justo com eles. Tê-los feitos botafoguenses pode ter sido um erro, afinal há muito tempo não temos motivos para comemorar. Mas também, se a escolha pelo time fosse feita a partir de títulos nós todos teríamos transtorno de personalidade: nos estaduais seríamos ABC de Natal. Na copa do Brasil, gremistas e cruzeirenses. No Brasileirão ficaríamos palmeirenses e por aí vai.
Se a escolha do pavilhão predileto fosse por tamanho de torcida seríamos chineses. Se o critério fosse tradição, Sheffield United. Time da moda? Barcelona. Então qual critério para a escolha do time dos meus filhos eu teria que usar?
Time, assim como os filhos, não se escolhe! Time, assim como os filhos, se é escolhido! Eu deveria ter me lembrado desta máxima antes de assinar aquele contrato, pois é claro que o Botafogo não deixaria de escolher os meus meninos. Não deixaria de gravar a nossa estrela em suas personalidades e formá-los para sempre.
Sou mesmo um péssimo negociador. Se tivesse me lembrado de tudo isso eu teria deixado espaço no acordo pré-nupcial para as coisas mais importantes da vida, pois fazer meus filhos alvinegros nunca caberia a mim, mas ao Glorioso, como o fez.
Ah...já ia me esquecendo: hoje eu tenho um cachorro aqui em casa.
Obs: O pedro, autor do texto, é filho de meu amigo Saint-Clair, e puxou do pai algumas boas virtudes: bom filho, bom pai, bom amigo, bom escritor e excelente botafoguense. Aproveitem e visitem o blog do pai aqui Asfalto & Mato. Ah, o Saint-Clair tem outra profissão, é o maior traficante de colesterol do Brasil e meu contrabandista de torresmo e chouriço exclusivo.
E cuida bem do cachorro, se não vai ter!
ResponderExcluirNão me entregue à Polícia Ambiental, Zatonio. Mas este meu filho é de rasgar o coração!
ResponderExcluirCara, tipo assim, amei esse texto! Hehehehehe
ResponderExcluirMuito bem escrito e identificação imediata. O Fogão realmente me escolheu mas não quis a minha filha, que é mulambenta (acontece nas melhores famílias). Ah! Também nunca quis cachorro e hoje tenho uma viralatinha linda, Ritinha. Essa sim, 100% alvinegra. Saudações alvinegras!